Bom dia, boa tarde, boa noite, Mellissa!!! Obrigada pelo tempinho em dividir informações com a gente.
Vamos às perguntas?
1. Muita gente diz que fazer redução de estômago é coisa de “gente preguiçosa” que não quis emagrecer e aí apelou para o “método mais fácil”, que seria o bisturi. O que você pensa sobre isso?
Em primeiro lugar, só acha que é fácil passar pelo processo de uma bariátrica quem nunca teve que fazê-lo, porque, além de toda a preparação para o pré-operatório, que é trabalhosa e leva entre um e dois anos com acompanhamento com equipe multidisciplinar, o pós da cirurgia é muito doloroso e, para sempre, a forma de se alimentar de um bariátrico será muito diferente das pessoas não operadas, tendo mal estar com o consumo de alguns alimentos e deixando outros de fora da dieta para sempre.
Em geral, cada paciente bariátrico vem de uma vida de obesidade, com familiares também obesos, e com uma relação com a comida que vai muito além de “comer mais do que deveria”. Na minha família somos sete bariátricos, minha mãe e pai obesos, avós, tios e primos também. Ou seja, uma sequência genealógica e de criação onde não se aprendeu a pensar nos alimentos de maneira saudável e que encontrou na comida, cada um com seus motivos, uma forma de prazer.
E isso se dá com grande parte das pessoas obesas que encontramos por aí, afinal, vivem em lares que não têm consciência alimentar, não questionam o que significa a indústria da alimentação e o que o marketing por trás dos alimentos faz. Não temos uma educação voltada aos alimentos e seus nutrientes, voltada a questionar o que se diz ser saudável ou não, consumimos grandes campanhas de marketing com etiquetas “verdes de saúde” sem entender que, esse produto ao ser ultraprocessado, ganha uma quantidade de químicas que mais fazem mal ao organismo do que bem, trazendo mais fome e mais vontade de comer.
Além do mais, somos cobrados desde muito cedo a estar em um padrão de peso que não necessariamente significa saúde, fazendo com que a vida e a mente gire em torno de dietas miraculosas que não ensinam a ver o alimento em seus micronutrientes, somente retiram calorias da alimentação, e quando se dão ao fim, criam aquela necessidade de se comer ainda mais.
Nossos nutricionistas mesmo, pelo menos todos que eu tive contato durante minha vida de obesa, nunca olharam para o que eu gostava de comer, para o que eu tinha dinheiro para comer, para as porções e pequenos prazeres que a alimentação significava, nunca me recomendaram um psicólogo para tratar dessa necessidade do ato de comer. Para mim eram entregues aquelas folhas de dietas prontas, as quais geralmente retiram carboidratos como se eles realmente fossem o vilão, reduzindo a 800 calorias por dia uma dieta que antes era de 3000 calorias, criando a fome, aquela gana de se comer.
Então não, o processo de uma bariátrica, se for feito em sua completude com um bom acompanhamento nutricional e, principalmente, psicológico (afinal, por que eu como tanto?), não é fácil. Nos deparamos com diversos demônios, diversos traumas, diversos desejos que antes não tínhamos consciência e, se quisermos fazer o processo da cirurgia valer a pena, precisamos encará-los no espelho.
A cirurgia te corta o estômago e, de um dia pro outro, reduz suas porções de comida em 10%. Isso emagrece? Com certeza emagrece. Mas a custo de um mal estar que demora a passar, a custo de ter que se encarar com esses demônios e buscar sempre estudar e saber mais sobre nutrição.
Quando eu fiz esse processo de cirurgia no trabalho, brincavam comigo que estava seguindo pelo lado mais fácil do emagrecimento, um funcionário que também estava acima do peso, mas não indicava ainda obesidade. O desafiei a seguir a dieta de um pós-bariátrico por uma semana, o desafiei a não comer mais doces porque quando comesse iria passar mal, o desafiei a não comer mais fritura porque quando comesse iria passar mal.
Enfim, é muito fácil falar que é um escape e uma solução mais simples, porém, só quem está na pele sabe o desconforto físico e mental que é esse processo.
2. A propósito, como foi o seu processo de decidir fazer a bariátrica?
Como já comentei um pouco por cima, venho de uma família de obesos e o sobrepeso está na genética, assim como a falta de educação em relação a alimentação e nutrientes. Alguns dos bariátricos da minha família voltaram a engordar e chegaram a fazer mais de dois procedimentos cirúrgicos, então eu nunca quis me envolver com a cirurgia bariátrica, talvez porque até então não estava disposta a lidar com os demônios que envolviam o ato e a necessidade de comer.
Durante toda a minha adolescência, fiz uma série de dietas, uma mais mirabolante que a outra, seja receitada por nutricionistas ou dessas que se acham pela internet.
Passei fome, desejei comer, odiei meu corpo, odiei a mim mesma. Fui à academia, recebia olhares tortos porque não sei o que vocês acham sobre academias, mas pra mim elas sempre foram lugares para pessoas magras continuarem magras, gordos não são bem vindos. Enfim, fiz vôlei, handebol, boxe, tudo para emagrecer e me encaixar em um lugar que não era meu, que eu não era bem vinda.
Aos 20 anos e com mais profundidade nas discussões, passei a estudar mais sobre o feminismo, sobre a forma que os corpos eram vendidos em uma indústria que chamava-se saúde, mas que servia só pra propagar mais ódio contra corpos fora do padrão. Comecei a estudar sobre a indústria farmacêutica e a forma que tratam dos sintomas e não das causas em prol do lucro, a indústria da carne que muito além ao sofrimento animal, desmata, mantém grandes plantações para ração e alimentação de gado, terra que poderia plantar para alimentar mais pessoas no Brasil e no mundo todo, e me deparei com questões éticas/filosóficas que iam além da discussão corpo magro/corpo gordo, que por sinal continuavam e sempre vão continuar presentes na minha forma de pensar.
Procurei me amar, procurei me conhecer, e com uns 24 anos procurei entender que um corpo gordo pode ser saudável e nisso passei a ser vegetariana, abrindo mão de todo tipo de carne e passando a comer legumes e verduras, coisas que não tinha o hábito até então.
Nessa época, foi uma surpresa que perdi 20kg em 3 meses só deixando de consumir carne e permaneci vegetariana até realizar a cirurgia, mas foi um pouco tarde essa mudança porque alguns efeitos colaterais de uma vida de excessos com frituras, café, cigarro e bebidas já tinha trazido ao meu esôfago.
Aos 26 anos precisei ir ao médico para tratar de problemas no esôfago, meu refluxo estava num nível que independente do que eu comesse, ele vinha após toda refeição, me fazendo tossir até vomitar aquele ácido que não ficava mais no estômago.
Na época eu pesava 132 quilos, não comia carne, comia muitos vegetais, mas ainda consumia muitos produtos ultraprocessados, frituras, cigarro e café, o que não promoveu uma melhora.
Eu estava com uma hérnia de hiato na válvula que fechava a ligação entre o esôfago e estômago, o que a impedia de ser fechada fazendo com que todo o ácido do estômago subisse para o esôfago. Tinha Esofagite Grau D de Los Angeles, feridas tão grandes no esôfago causadas pelo ácido em excesso que precisaria de um tratamento bem severo. Estava começando a ter problemas nos dentes deixando-os frágeis por conta do ácido sempre presente, enfim, precisava fazer algo para resolver isso e com certa urgência.
Foi nessa fase que me deparei com a necessidade de fazer uma bariátrica e isso me deixou por muito tempo encucada: afinal, foram tantos anos odiando meu corpo, depois alguns anos aprendendo a me amar, para depois voltar a um estágio em que precisaria recorrer à perda de peso para estar saudável.
Briguei muito contra mim mesma, mudei a alimentação eliminando 100% fritura, comidas muito temperadas e coisas que faziam mal, mas o estrago já estava feito e qualquer coisa que eu ingerisse me fazia mal. A solução de meu gastro foi a bariátrica, porque o refluxo e todo esse mal estar estava diretamente ligado, não só à alimentação, mas ao excesso de peso.
Então entrei no processo do pré-operatório, mesmo de início não estando 100% satisfeita com essa solução.
3. Qual foi o tipo de cirurgia que você fez e por que optou por ela ao invés das outras presentes no mercado?
Quem opta pelo método de cirurgia é o médico, de acordo com o seu quadro de obesidade e problemas correlatos, definindo qual será melhor para você a longo prazo.
No meu caso, a cirurgia que ele decidiu foi o Bypass Gástrico, um procedimento que corta o estômago e também o início do intestino grosso. Ou seja, um método mais agressivo visto que além da redução do espaço para se armazenar os alimentos, operados de Bypass ainda têm uma absorção de nutrientes muito prejudicada, uma vez que ela é feita pela início do intestino que não temos mais.
4. Sei que cada caso é um caso, mas como foram o seu pré e o seu pós-operatório?
O pré-operatório foi feito com uma equipe multidisciplinar. Nutricionista, pneumologista, cardiologista, endocrinologista e, o mais importante de todos, psicólogo.
Precisei fazer uma série de exames como de sangue, capacidade respiratória, exames cardíacos, índice de gordura e por aí vai, mas confesso que no processo pré-operatório o acompanhamento mais importante que tive foi com o psicólogo.
Optei, na época, por iniciar o tratamento com uma psicanalista, visto que minha adolescência toda já tinha visitado diversos profissionais da psicologia e suas formas de tratamento não fizeram efeito. Cheguei, inclusive, a consultar com psiquiatra, tomar remédio dos 15 aos 18 anos, mas nada que resolvesse o real problema do que significava a comida e como lidar com ela.
Na psicanálise, que foi o tratamento que optei no pré-operatório e sigo firme fazendo até hoje, encontrei uma maneira de me ouvir e entender o que me levava a comer mais do que precisava e encontrar certo conforto na alimentação, podendo de uma vez por todas iniciar o tratamento em relação a isso.
Com todos os exames realizados e a autorização de cada profissional acerca da cirurgia, bastou agendar com meu gastro um dia para a realização. Esse processo levou cerca de um ano entre visitas a todos os profissionais, exames e retornos de consulta, uma vez que além dos problemas gástricos, eu não tinha nenhum outro problema de saúde que precisasse ser tratado antes da cirurgia, por exemplo, não tinha nenhuma comorbidade que pudesse vir a ser um risco para realizá-la, como pressão alta, algum problema no coração ou coisas do gênero.
Já o pós-operatório foi um inferno. Fiquei três dias no hospital, estava com a barriga inchada porque é necessário inserir um gás no estômago durante o procedimento cirúrgico para que o médico tenha acesso aos órgãos separadamente, e esse desconforto não me deixavam andar sem estar curvada, um passo de cada vez, com muita dor. Nesses três dias, nem água eu podia tomar, uma escolha de procedimento do meu cirurgião, mas surpreendentemente eu nem queria. Fazia exercícios com a fisioterapeuta do hospital sob muita dor até para respirar e desejava só dormir por uma semana até que a dor e o desconforto acabassem.
Hoje analiso esse momento com um período de luto que vivi pela Mellissa que não estaria mais ali. Eu me entreguei um pouco à dor dessa perda de quem eu era e precisava estar pronta a encarar esse renascimento e a nova Mellissa, a nova vida que viria depois de sair do hospital.
Os próximos meses, principalmente os 3 primeiros, foram uma forma de existência na qual fazia falta uma parte de mim. Eu não tinha fome, não tinha vontade de comer porque o processo de comer era tão trabalhoso, tão sem graça, repleto de seus caldos, frutas e purês, que de repente a comida que era tão importante pra mim, virou um mero ato de nutrição.
Nesse período pós-bariátrica, o que me deu forças foi o tratamento psicanalítico. Era como se eu fosse um bebê e tivesse nascido agora, comendo só papinhas, sem sentir muito gosto ou prazer na alimentação, porque ela era só um preenchimento de uma lacuna física. Mesmo assim, 30 dias depois da cirurgia já estava trabalhando novamente, levando as pequenas porções para o trabalho e comendo porque era obrigada, passando por esse período um tanto quanto deprimida.
Mas aí eu precisava lidar com a dor desse luto de alguma maneira e, nesse período, após os três primeiros meses, eu e minha companheira passamos a estudar muito mais sobre nutrição, alimentação natural e ultraprocessada, entendendo que, como a partir de então eu teria um déficit de nutrientes causados pela falta do início do intestino, eu precisava ingerir esses nutrientes em maior quantidade através da alimentação. Tudo para que eu não precisasse vir a ficar presa a remédios e compostos químicos, e essa foi a reviravolta no sentido da alimentação que tive.
A cirurgia foi como um estopim, o chute que eu precisava para olhar as coisas de uma forma diferente. Fisicamente ela me machucou e muito, mas ela também foi responsável por essa mudança de padrão, por essa mudança no olhar sobre mim mesma e a comida, sobre a forma de alimentação e o que consumimos.
Minha companheira, que na época também tinha sobrepeso e me ajudou mudou nos estudos, também decidiu mudar sua alimentação e foi meu suporte para que todo esse processo não tenha sido tão difícil. Ela tinha vontade de comer seus doces e comidas mais calóricas, mas sabendo que eu não podia comer, optava por não comê-los e essa parceria me ajudou muito.
Passamos juntas a apreciar outros tipos de comida, aprender a cozinhar muito mais e melhor, acrescentamos muitos vegetais a nossa alimentação e pegamos apreço por isso, por comer de forma natural e saudável.
É engraçado pensar, nós brincamos hoje que ela também fez uma bariátrica, mas psicológica, porque dentro de um ano, ela perdeu 25kg somente mudando a alimentação, estudando nutrição, deixando de consumir ultraprocessados.
5. Para quem ainda não entende nada sobre o assunto, por que as pessoas que fazem bariátrica emagrecem tão rapidamente assim?
Dependendo do método que o paciente faz, a redução do tamanho do estômago pode chegar a 90%. Ou seja, se antes se tinha um capacidade de comer 500g de comida por uma refeição, pós cirurgia essa capacidade alimentar é reduzida e muito.
Além do mais, no caso do Bypass, que foi o método que eu realizei, existe ainda o corte de boa parte do início do intestino, o que faz com que o processo de digestão e liberação do alimento seja mais rápido, aumentando a velocidade do metabolismo.
A perda de peso pós-bariátrica mais expressiva é nos três primeiros meses, uma vez que, por conta da cicatrização do intestino e estômago, a dieta é composta por líquidos no primeiro mês (cerca de 70ml por refeição), por líquidos mais grossos como sopas batidas no segundo mês (cerca de 100ml) e por purês no terceiro mês, podendo inserir carnes magras e muito bem cozidas (cerca de 150ml). Além do mais, bebidas alcoólicas, doces, refrigerantes e qualquer tipo de fritura é 100% vedado, o que leva à perda de peso.
Detalhe que essa dieta é diferente para cada paciente, tem a ver com a necessidade física e o histórico de comorbidades de cada um e é indicado pelo gastro em parceria com a nutricionista. Então, os processos podem ser distintos para cada paciente.
No papel é isso que faz um bariátrico perder peso rápido. Porém, vai muito além disso para a real efetividade da perda de peso e do sucesso da cirurgia.
6. Você sofreu com flacidez? Quebra de unhas? Queda de cabelo ou algo assim? Nos conte um pouco mais a respeito, se conseguiu reverter, como fez ou está fazendo etc.
Como eu passei a estudar muito sobre nutrientes e como comer de forma a garantir os micronutrientes e vitaminas que meu corpo precisava para não ter essa perda de cabelo ou quebra de unhas tão evidentes, não o tive de forma que precisasse de tratamento.
Claro, perdi bastante cabelo e era desesperador ter que varrer a casa duas vezes por dia, mas essa perda não foi de forma expressiva a ponto de precisar de medicação. Além de ter bastante cabelos, a perda foi consistente, de maneira que não fiquei com falhas ou buracos como alguns pacientes relatam.
Flacidez? Bom, fiquei sim com sobras de pele nos braços, meio das pernas e na barriga, o que é normal para qualquer bariátrico.
Pense comigo: eu sai de 132 quilos para 62, toda a pele que segurava esses 132 quilos não tem como simplesmente desaparecer. Apesar da flacidez, ela não me incomoda clinicamente falando, com assaduras ou coisas do tipo (reclamação frequente de muitos pacientes), então no momento não vejo a necessidade de remoção.
7. Seu médico te receitou colágeno? Tem muito mito e verdade sobre ele, né? E nem todos os médicos gostam. Porém, quando fiz cirurgia para levantar meus seios, meu médico me indicou justamente contra flacidez e disse para que tomasse junto com a vitamina C. Fora os exercícios físicos e mais tudo aquilo que a gente já sabe que ajuda. E seu médico, o que te disse e o que te receitou contra a flacidez etc?
Questionei o gastro e também a nutricionista sobre o colágeno e ambos seguem a linha de que o colágeno é um mito criado pela indústria, então nenhum dos dois me receitou e não tomei nenhuma medicação seguindo nessa linha.
Mesmo assim, por pesquisa própria, eu busquei trazer para a minha alimentação alimentos que ajudassem nesse sentido. Ou seja, possuíam mais Vitamina C, responsável não só pela imunidade, mas também pela produção do colágeno.
A “receita contra a flacidez” dada por eles foi exercícios físicos focados nos locais que têm mais gordura, como os braços, pernas e barriga, mas para um bariátrico não existe a opção de não ficar com um pouco de sobra de pele e quem faz a cirurgia já deve estar consciente disso.
8. Como foi sua relação com os seios depois da cirurgia? Tem gente que diz que perdeu tanto, que resolveu colocar silicone. Já outras acham até melhor assim. E você?
Meus seios reduziram em ¼ do que eram. Ou seja, ficaram muito pequenos mesmo e caídos, o que é normal por também se tratarem de gordura.
Não gosto da ideia de colocar silicone, visto que hoje procuro uma vida mais natural e sem procedimentos estéticos e da indústria da beleza, mas confesso que também não gosto deles.
Ainda estou num processo de entendê-los e entender minha relação com eles, me passa pela cabeça tirá-los, afinal, ser mulher está muito além de ter ou não ter seios, mas ainda não tenho uma posição em relação a isso.
Não julgo quem busca restaurá-los com silicone, também não julgo quem escolhe tirá-los. Assim como espero não encontrar julgamentos em talvez decidir ficar com eles caídos e pequenos.
A mesma coisa eu penso sobre as outras sobras de pele que tenho, nas pernas, barriga e braços. Esteticamente elas me incomodam? Um pouco sim, afinal, existe uma indústria que nos diz o que achar belo. Porém, clinicamente elas não me trazem problemas, então eu fico nessa briga diária de aceitação do corpo como ele está para não cair nesse discurso do que é ter o corpo perfeito.
Se talvez eu vá tirar as sobras de pele daqui uns anos? Talvez sim e isso não é um problema. Se talvez eu vá ficar com elas e aprender a me amar assim? Talvez sim também e não vejo problema nisso.
O importante aqui e o que eu busco para mim é entender de onde vem esse desejo de um corpo ideal, se é meu, se é cultural, e entender que o corpo que eu tenho é meu e só meu, não é feito para o olhar do outro, e que eu preciso amá-lo do jeito que eu desejar que ele seja, sem interferência de terceiros.
9. Se você pudesse listar alguns pontos bons sobre a cirurgia bariátrica, quais seriam?
A maior vantagem da bariátrica para mim foi ter tido a oportunidade de buscar me conhecer melhor, entender qual a minha relação com a comida e o que ela significava para mim, criando um novo significado e novas experiências com ela.
Passei a cozinhar muito mais, a estudar muito mais sobre alimentação e, finalmente, encontrei uma maneira de me alimentar que, além de ser prazerosa por si só, também me permite estar saudável e com os exames e vitaminas em perfeito estado.
10. E se pudesse listar os ruins? Tipo aquelas coisas que quase ninguém fala e que quem está pesquisando sobre deveria saber?
A dor no pós-operatório, o vazio que se sente ao não ter mais o prazer na comida logo que se faz a cirurgia. A tristeza que é entender que a maioria das relações sociais se dão em torno de uma mesa, seja de comida ou bebida, se adequar a isso, entender isso, não ficar triste por não fazer mais parte desse momento de comunhão em torno de uma mesa que se resume à alimentação.
É um processo doloroso olhar para dentro de si. A dor física existe, mas depois de um tempo ela passa, seja com remédios ou com a cicatrização do procedimento, mas renascer e se encaixar nesse mudo novo dói e o paciente precisa estar disposto a isso se quiser ter sucesso na bariátrica.
Outra coisa ruim que acaba rolando com os bariátricos, pelo menos comigo, é que tem alguns alimentos que não consigo comer sem passar mal, o famoso dumping, que é quando a comida passa muito rapidamente pelo estômago e intestino, causando pressão baixa, enjoo, diarreia, inchaço e dores na barriga. Com a maioria dos doces acontece isso e, por alguns minutos até uma hora, preciso deitar e cochilar, o que não é nada bom se você está em um local público, por exemplo.
11. A propósito, qual é o grau de risco dessa cirurgia (morte, etc)? A gente sabe que toda cirurgia possui riscos, mas e em relação a essa em específico?
Não sei, kkkk. Foi o tipo de coisa que eu não pensei em perguntar pra não ir com essa ansiedade para a sala de cirurgia.
12. Quantos kg você perdeu? (pode falar semanalmente, se achar melhor). Você já chegou no peso em que você gostaria/precisava? Enfim, se puder falar um pouco sobre esse processo.
Quando eu fiz a cirurgia, estava com 132 quilos. Atualmente, estou com 62 quilos e estabilizei nesse peso já faz alguns meses.
Geralmente a perda de um paciente de Bypass é de 40% do seu peso, a minha foi um pouco maior e acredito que seja porque fiz mudanças na alimentação que não somente em suas porções, mas sim em quais alimentos se ingerem.
Aqui embaixo tem um gráfico da minha perda de peso desde o início da cirurgia até hoje. Semanalmente eu sempre me pesava e preenchia esse app para fazer o acompanhamento.
Atualmente me sinto muito magra e, como brinco, sou puro osso. O peso que eu gostaria de ter ficado é 80 quilos. Ou seja, ainda estaria com sobrepeso de acordo com o IMC, visto que minha altura é 1,67, porém, teria mais bochechas, seria aparentemente mais saudável.
Quando cheguei a esse peso, estava me achando, gostando muito de mim, de como estavam minhas bochechas e meu corpo. Porém, o emagrecimento continuou e hoje com 62 me acho muito magra e estou estudando para ganhar um pouco de peso, só que de forma saudável.
13. A gente sabe que a cirurgia não é milagre. Ou seja, não é por que fez, que ficará “magra para sempre”. Na verdade, muita gente volta a engordar depois de uns anos. O que você pensa sobre isso? Por que acontece (mesmo com o estômago tendo sido reduzido) e quais dicas você dá para que isso não aconteça?
Pacientes de bariátrica que voltam a engordam são por dois motivos:
1- Não aprenderam a comer corretamente. Ou seja, reduziram as porções do que se come, mas continuam comendo ultraprocessados, doces, frituras, bebidas alcoólicas e alimentos que têm um índice calórico maior do que o metabolismo pode processar.
Temos que entender que, ao reduzir as porções, a perda é imediata, mas uma hora o corpo se acostuma com aquela quantidade e tem um metabolismo que lida com ela já. Então, se optar por alimentos muito calóricos, não importa a quantidade, pode haver ganho de peso.
2- Acabam forçando cada vez mais comida no estômago, “comendo com os olhos”, o que faz com que o estômago, que é um órgão elástico, vá se esticando e ficando cada vez maior, muitas vezes voltando ao seu tamanho normal e permitindo a ingestão de mais calorias.
Como já cansei de ouvir, nós bariátricos operamos o estômago e não os olhos ou a mente, e é aí que mora o grande perigo.
É normal que pacientes bariátricos venham a desenvolver outros vícios e aí mora outro grande perigo. Porque se, em geral, o paciente tinha um vício em comida que, fisicamente pós cirurgia, está impossibilitado, ele vai ter que encontrar outra coisa na qual amparar esse vício. Nisso existem muitos relatos de pacientes bariátricos com vício em bebidas, jogos, sexo, drogas e compras.
Por isso é tão necessário falarmos de tratamento psicológico para pacientes bariátricos, afinal, muitos comem e nem sabem por que, têm compulsão alimentar, encontram prazer na alimentação e em certos alimentos, e se não for tratado os motivos de se comer, a longo prazo o ganho de peso pode vir a acontecer, ou então o desenvolvimento de outro vício como válvula de escape para a impossibilidade de se comer.
14. Agora a pergunta que não quer calar: quanto foi e como você descobriu o melhor médico para você? Pois a gente sabe que fora o preço poder variar de cidade a cidade, o barato também pode sair caro.
Eu dei início ao processo com um médico que já tinha feito a cirurgia bariátrica em meu avô, mãe e tia. Porém, como ele não aceitava o meu plano de saúde para o procedimento, o custo da operação com ele, sem contar hospital e internação que isso seria bancado pelo plano, ficariam em 15 mil reais e eu não tinha esse valor.
Então eu pesquisei em alguns grupos e encontrei um médico que ficava próximo ao meu trabalho, descobri que ele já tinha operado a minha prima para a remoção da vesícula e fiz uma consulta com ele. Expliquei a questão financeira e ele, mesmo sem aceitar o plano, conseguiu fazer a cirurgia por 5 mil reais.
Desde o início do tratamento com ele eu percebi que tinha feito a escolha certa e não somente pela economia. O médico me deu seu celular, estava em constante contato comigo, respondendo às minhas dúvidas pelo whatsapp e dando dicas, explicando exatamente tudo que eu precisava saber sobre a cirurgia. Ele foi sempre muito presente e muito atencioso, diferentemente do outro cirurgião que iniciei o processo que, por ser talvez “muito famoso”, não tinha nem tempo nas consultas, que duravam cerca de 10 minutos somente.
Já faz um ano e meio que fiz a cirurgia, agora meu acompanhamento com o gastro é a cada seis meses, mesmo assim o Dr. sempre me manda mensagem perguntando como estou, se tenho alguma dúvida ou tenho algum problema relacionado ao estômago, mando mensagem no whatsapp pra ele e tenho a resposta logo que possível. Enfim, foi a escolha certa.
15. E em relação a medicamentos, acessórios etc no pós-cirúrgico, você gastou muito? Se puder falar por alto, ou até mesmo dar dicas de acessórios e investimentos fora da cirurgia e afins, a gente agradece.
Confesso que não lembro muito bem tudo que gastei no pós-cirúrgico.
Precisei de uma meia de compressão que foi cerca de 100 reais, e muitos remédios para dor, gases, refluxo e afins. Como fiquei com dreno por 10 dias, também precisei investir em gaze e água oxigenada.
No sentido de alimentação, precisei de um Nutrem por três meses, que é um suplemento alimentar repleto de vitaminas. Leite e iogurte sem lactose, legumes e frutas.
Acho que é isso então! Muito obrigada pela entrevista e espero que ela possa ser útil para muita gente, Melissa!!
Então é isso, gente. Esse é o relato honestão de uma bariátrica que aprendeu que, mais do que parar de comer, precisamos reaprender a nos relacionarmos com a comida, com o motivo de comermos e com o que comemos, e essa dica é importante para todo mundo, afinal, ser magro não é sinal de saúde e precisamos de uma vez por todas parar de achar que é.
Agradeço aqui o espaço de poder trazer um pouco mais sobre a minha experiência em relação à cirurgia e posso voltar em uma outra oportunidade para responder as dúvidas de vocês, então coloque aí nos comentários o que você gostaria de perguntar pra mim que a Lu me manda e fazemos um post só respondendo!
E se quiserem me acompanhar no Instagram, @mxpitta, lá eu não falo nada de bariátrica, é só minha conta pessoal mesmo, rs, mas podem mandar DM perguntando suas dúvidas que vou ter o prazer de responder 😉
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